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Por que sou contrário ao "distritão"


Está tramitando no Congresso Nacional uma proposta que visa alterar a forma como os deputados e vereadores são eleitos. O que se quer é aprovar o chamado "distritão". Mas isso é bom ou ruim para o país?

No atual modelo (proporcional com lista aberta), os partidos se unem em coligações e o eleitor pode votar tanto em um candidato específico quanto no partido. Após a contabilização dos votos, é definido o quociente eleitoral (que nada mais é do que o número de cadeiras a que a coligação terá direito). Só após essa operação é que se passa a conferir quem foram os candidatos mais votados; aqueles cuja posição se enquadre no número de cadeiras obtidas estarão eleitos. Por exemplo: Suponhamos que exista uma coligação entre PT, PSDB e PMDB e que o quociente eleitoral tenha apontado que essa coligação conseguiu o direito de ocupar 15 cadeiras na câmara dos deputados. Só a partir daí é que será feita a conferência dos votos que cada candidato recebeu, os 15 mais bem votados estarão eleitos.

Caso o distritão seja aprovado, haverá uma mudança drástica: a partir de agora, os candidatos mais bem votados serão eleitos e ponto final. Não importa qual seja o partido ou a coligação, só importa o número de votos que cada candidato obteve. O sistema deixará de ser proporcional para se tornar majoritário — como já acontece nas eleições para presidente, senador, governador e prefeito.

Diante da crise de representatividade que estamos vivendo, é natural que uma proposta como essa soe benéfica aos olhos dos mais desatentos. Aparentemente, o povo se sentirá muito mais bem representado sabendo que ganharam aqueles que obtiveram mais votos e não houve espaço para a figura do "puxador de votos", aquele candidato que consegue tantos votos que faz com que o quociente eleitoral de sua coligação suba bastante e com isso, candidatos com menos votos podem ser eleitos em detrimento de outros mais bem votados mas cuja coligação não conseguiu cadeiras suficientes.

O problema é que, na prática, a questão é um pouco mais complexa: o distritão trará sérios problemas. Problemas esses que são totalmente incompatíveis com o estado democrático de direito em que vivemos. Passarei a expô-los:

Em primeiro lugar:haverá uma clara vantagem dos candidatos que já possuem mandato. Essa vantagem acontece porque aqueles que já foram eleitos uma ou mais vezes são, naturalmente,mais conhecidos pelo povo. Ou seja, a chance de renovação na política diminui muito uma vez que aqueles que já possuem um "nome" na política têm uma tendência a serem mais votados do que aqueles que estão chegando agora.

Além disso, haverá um enfraquecimento dos partidos. Se o único critério para assumir uma cadeira for o número de votos, a política partidária perde força. E ao contrário do que o senso comum diz, isso não é bom para a democracia. É através dos partidos que o eleitor tem uma noção sobre qual o lado do candidato. E isso é de suma importância para o equilíbrio democrático. Tirar a força dos partidos é torná-los uma mera ficção eleitoral que é usada apenas como meio para propor uma candidatura. Com isso, qualquer possibilidade de um voto mais ideológico estará acabada, pois se um candidato precisa do maior número possível de votos, ele vai procurar um partido que lhe proporcione mais visibilidade, independente da ideologia. Não seria difícil ver anomalias do tipo Marcelo Freixo se candidatando pelo PSDB ou Ronaldo Caiado pelo PT. Só alguém muito ingênuo pode enxergar algum benefício nisso.

Em terceiro lugar, haveria o problema do descarte de milhões de votos. Hoje, mesmo que o seu candidato não seja eleito, seu voto será utilizado para contabilizar o quociente da coligação da qual ele faz parte. Assim você pode ajudar a eleger outro candidato do mesmo partido do seu, o que não é perfeito, mas já é alguma coisa. Caso o distritão seja aprovado, se você votar num candidato que não ficou entre os mais votados, seu voto não servirá para absolutamente nada! Será descartado! É óbvio que isso vai agravar ainda mais a crise de representatividade que vivemos.

Por fim, temos a pior de todas as consequências: com a aprovação do distritão, vivenciaremos a possibilidade real de ver UM ÚNICO PARTIDO ELEGER TODOS OS DEPUTADOS DE UM DETERMINADO ESTADO. No sistema atual, isso seria impensável. Mas num sistema exclusivamente majoritário, seria plenamente possível. Veja o estado do Acre, por exemplo,que tem direito a eleger 8 deputados federais. É plenamente possível que um único partido tenha os candidatos mais bem votados desse estado. Nesse caso, o estado simplesmente não terá uma bancada de oposição na câmara dos deputados. Esse seria um dos maiores golpes já sofridos pela nossa democracia.

Vale lembrar que o distritão constitui um modelo eleitoral tão interessante que é adotado por países que possuem uma democracia extremamente avançada como, por exemplo...o Afeganistão! 

Encerro com a máxima do jornalista americano H.L. Mencken:

"para todo problema complexo, há sempre uma solução clara, simples e errada."
Por que sou contrário ao "distritão" Por que sou contrário ao "distritão" Reviewed by Alcino Júnior on quarta-feira, agosto 16, 2017 Rating: 5

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